9/30/2008

God of Negroes [Ouvir/Baixar] - Gravações domésticas

“Entrei em quadrícula” na região de Farim, no norte da Guiné-Bissau, como oficial do Batalhão de Caçadores 1887, em 1966, após uma estadia de poucos meses no quartel da Amura em Bissau. Todos aqueles meses de Guiné provocaram em mim uma grande tristeza e desânimo, ao constatar que os mais de 500 anos de presença portuguesa naquelas paragens não tinham produzido nenhum resultado civilizacional palpável. As populações indígenas viviam no meio das maiores carências, sem meios sanitários de qualquer espécie à sua disposição, não falando uma palavra da língua portuguesa, abandonadas, exploradas, ignoradas, desprezadas.

A administração pública e os lugares de chefia dentro da sociedade civil estavam entregues a uma elite de cabo-verdianos que exerciam a mais tirânica repressão sobre os guineenses. Estes, desamparados, pareciam até esquecidos por Deus. Foi então que me surgiu a idéia de me dirigir ao “Deus dos Negros” a pedir-lhe piedade para o seu povo, já que o deus dos brancos parecia tê-lo abandonado.

Assim nasceu “God of Negroes”, uma balada pungente, verdadeiro “negro spiritual”, como apelo derradeiro para a salvação de um povo inocente e infeliz, a quem mais ninguém parecia poder socorrer.

Mais tarde, os moços do Conjunto Académico de João Paulo pediram-me para gravar esta minha composição, o que fizeram, sem qualquer interferência da minha parte. Foram a minha casa um gravador portátil gravar a minha versão, e a próxima vez que ouvi falar da música foi quando a ouvi na rádio interpretada por eles. Tive pena de não me terem pedido algumas dicas que poderiam ter melhorado o resultado comercial final, principalmente no que respeita ao sotaque madeirense do Sérgio Borges, que eu poderia ter ajudado a corrigir para que o inglês ficasse mais decente, mas... paciência, não foi por falta de eu ter oferecido ajuda.

Enfim, aqui está a minha versão original, propositadamente repetitiva e monocórdica, tal como a concebi in loco na Guiné-Bissau.

NOTA: Estas gravações domésticas são como rascunhos. Feitas em gravador de cassettes, sem recursos de espécie alguma, destinam-se unicamente a figurar como fichas num arquivo de memórias.